quinta-feira, novembro 23, 2006

O código genético humano varia de um indivíduo para outro muito mais do que se imaginava, de acordo com pesquisa liderada por cientistas americanos.



Na pesquisa, os cientistas utilizaram novas formas de examinar o DNA de seres humanos, a substância que contém o código do desenvolvimento de cada indivíduo.

Os cientistas chegaram à conclusão de que a suposição de que o DNA de dois seres humanos é 99,9% semelhante em seu conteúdo e identidade já não se sustenta.

Eles descobriram que o código de DNA de uma pessoa pode se diferenciar em pelo menos 10 vezes mais uma da outra, fazendo com que a diferença chegasse a 1%, o que explicaria a razão pela qual algumas pessoas são susceptíveis a doenças sérias com fundo genético.

Eles dizem que seu estudo pode ajudar a explicar por que algumas pessoas são mais suscetíveis a certas doenças e por que alguns respondem melhor a determinados tratamentos.

Ainda que o estudo torne o assunto mais complexo, por revelar a existência de um maior número de variáveis, também abre as portas para possíveis novas abordagens na pesquisa de doenças mentais causadas pela senilidade, por exemplo.

Descobertas

Até hoje, a pesquisa genética era tradicionalmente focada em variações simples de DNA.

A descoberta publicada nesta quinta-feira revela que, ao contrário do que se acreditava, as pessoas podem ter mais de duas cópias de cada gene (as que seriam herdadas de cada um dos pais).

De acordo com o estudo, essas variações são consideradas normais, só que quando elas acontecem de modo desordenado em genes mais importantes, podem desencadear uma série de doenças.

Além disso, o texto sugere que as inúmeras diferenças físicas e psicológicas também acontecem por causa das variações dessas “cópias múltiplas”.


Bases de código genético
Exemplos de bases de código genético

Os cientistas fizeram uma análise detalhada do DNA encontrado em 270 pessoas e verificaram que longos trechos de seu código estava duplicado ou em falta.

Graças ao desenvolvimento de novas tecnologias para se analisar sequências de DNA - uma espécie de "microscópio molecular" - os cientistas enfocaram variações de média-escala no código genético, numa escala de milhares de letras de DNA.

Um grande número dessas variações ocorrem em áreas do genoma que não prejudicariam a saúde humana, disseram Stephen Scherer e seus colegas à revista especializada Nature.

Grandes diferenças

Mas outras variações podem ter um papel em vários distúrbios.

Até agora, a investigação do genoma humano tendeu a enfocar mudanças muito pequenas no DNA - numa escala de apenas uma ou poucas bases ou "letras" (vide quadro) no código bioquímico que programa a actividade celular.

Durante muitos anos, cientistas também puderam examinar sob microscópio anomalias em larga-escala que surgem quando o DNA todo sofre distorções, ou cromossomas são truncados ou duplicados.

Entre os resultados desse novo tipo de análise conhecida como Variação do Número de Cópias (CNV em inglês) trouxe revelações surpreendentes.


MOLÉCULA DE DNA
Uma molécula dupla de DNA é ligada por compostos químicos chamados bases.
Adenina (A) se liga à tiamina (T); citosina (C) se liga à guanina.
Estas 'letras' formam o 'código da vida'; há cerca de 2,9 biliões de bases de pares no genoma humano formadas em 24 grupos distintos, ou cromossomas.
Escritos no DNA estão cerca de 20-25 mil genes que as células humanas usam como modelo para fabricar proteínas; estas moléculas sofisticadas constroem e mantém o nosso organismo.

Os pesquisadores ficaram surpreendidos ao localizar 1.447 variações do tipo CNV em quase 2.900 genes, o começo dos "moldes" escritos no código que são usados por células para fabricar proteínas que são fundamentais para o nosso organismo.

Este é um número enorme de variações entre um indivíduo e outro.

"Cada um de nós tem um padrão único de perdas e ganhos de seqüências completas de DNA", disse Matthew Hurles, do Instituto Sanger do Wellcome Trust da Grã-Bretanha, que participou do projecto.

"Uma das verdadeiras surpresas desses resultados foi o quanto o nosso DNA varia em número de cópias. Nós estimamos que isso ocorre em pelo menos 12% do genoma."

"A variação do número de cópias que pesquisadores viram antes era simplesmente a ponta do iceberg, enquanto a maior parte fica submersa, sem detecção. Agora nós observamos a contribuição imensa desse fenómeno às diferenças genéticas entre indivíduos."

Doenças

Os novos conhecimentos vão mudar a forma como cientistas procuram genes envolvidos em doenças.

"Vários exemplos de doenças resultantes de mudanças no número de cópias estão surgindo", comentou Charles Lee, um dos líderes do projeto do Hospital Brigham and Women's e Escola de Medicina de Harvard, nos Estados Unidos.

"Uma revisão recente enumera 17 males só no sistema nervoso - inclusive o mal de Parkinson e de Alzheimer - que podem resultar de tais alterações do número de cópias."

Os pesquisadores não sabem ainda porque as variações das cópias surgem, mas é provável que exista alguma ligação com o encadeamento do material genético que ocorre na produção de ovos e esperma, um processo sujeito a erros.

Assim como ajudar na investigação da doença e no desenvolvimento de medicamentos, a pesquisa também vai contribuir para o estudo da evolução humana, que observa variações genéticas em populações modernas buscando entender suas relações com povos ancestrais.

da BBC Brasil

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